ROSEMARY, MEU BEBÊ
(Uma História verídica)
No dia 12 de agosto de 1976, tomei um avião da VASP em direção a
Fortaleza, lá chegando a zero hora do dia 13 de agosto. Pretendia lançar o primeiro dos meus livros, o “Cubos de Gelo”, em Crato, minha cidade natal, através do
Rotary Club daquela cidade. Os dias 13 e 14 passei visitando clubes de Rotary a
propósito do lançamento do livro, também, em Fortaleza. Visitei ainda algumas
clínicas de beleza que usavam os produtos Mary Schultze e aproveitei a boa vontade
de Isaura, dona da Clínica Life, para me cuidar um
pouco.
No Domingo, 15 de agosto, mamãe estaria reunindo todos os filhos para
comemorar o seu 68º aniversário, que seria no dia 16, mas que iríamos comemorar
no domingo à meia noite, entrando a segunda-feira em festa. À tarde tive uma dor
de cabeça, provavelmente devido ao tempo excessivo que fiquei numa sauna. Tomei
um comprimido e me deitei, enquanto
mamãe e algumas irmãs iam ao aeroporto esperar o nosso irmão José, que chegaria
do Recife para o aniversário de mamãe. Quando acordei, lá pelas 19 horas, estava
alarmada com um sonho muito plástico que acabara de ter. Chamei minha irmã Savany, e contei o
sonho.
Sonhei que recebera um cartão postal, com a “Última Ceia” colorida em alto relevo,
enviado por meu marido, que estava no Rio e faria aniversário também no dia 16.
Dentro do cartão, com a letra dele, havia esta mensagem: “Mamãe, como é que
uma... pode fazer isto com
o ....?” Assinado: Hans.
Em lugar dos pontinhos havia a cabeça da 'Virgem Maria", que eu
interpretava como sendo a palavra “mãe”, e em seguida, a cabeça do Menino Jesus,
que eu interpretava como sendo a palavra “filho”.
Então o conteúdo da mensagem que dei a minha irmã era este: “Mamãe,
como é que uma mãe pode fazer isto
com o filho?
"
Uma interpretação total para a mensagem me veio à mente e comecei a
chorar. Meu marido estava muito doente, desde o assalto, e provavelmente iria
morrer logo e este seria o seu último aniversário. Eu estava longe dele, daí a
mensagem. Savany me consolou dizendo que bem poderia ser outra coisa e quando
mamãe e os irmãos chegaram, contei o sonho e todos me consolaram, dizendo que eu
estava nervosa por causa dos assaltos à nossa casa, e tudo iria terminar
bem. Mas continuei a sentir aquela sensação iminente de que algo estava para
acontecer e mentalmente pedi a Deus que não fosse uma notícia de
morte.
À meia noite, quando íamos começar a festa do aniversário de mamãe, soou
a campainha e alguém gritou:
-
D.
Rosa, encomenda pra Sra.
Entendi que devia ser notícia
ruim de casa. Rosa, minha irmã de São Paulo, e Savany, minha irmã viúva
que morava com mamãe, foram atender e demoraram alguns minutos. Quando entraram,
Rosa trazia uma caixa que parecia ser um bolo de aniversário. Dentro dela havia
uma linda criança de três dias, a qual, segundo informações contidas num papel
anexo, havia nascido exatamente na hora em que eu desembarcara no
aeroporto - zero hora do dia 13 de agosto. Dentro da caixa havia uma
carta pedindo para ser adotada
('que Deus lhe recompensará'), uma lata de leite Pelargon, uma de
Nidex, duas mamadeiras de plástico, muda de roupa fina, bordadinha à mão, e duas
fraldas. Provavelmente, a mãe daquela criança estava abandonando-a forçada pelos
preconceitos, mas devia amá-la de verdade, pois havia pensado nos mínimos
detalhes. Quando vi a menina, senti uma sensação estranha e uma voz bem
suave, lá dentro, dizendo: “Como é que uma mãe pode fazer isto com o
filho?”
Foi grande o alvoroço! Todos queriam ver a linda garotinha morena, de
cabelos e olhos “negros como a asa da graúna”, que estava dentro da
caixa. Então, mamãe tomou-a amorosamente nos braços e começou a chorar de
emoção. Todas as mulheres ali presentes foram sondadas sobre a possibilidade de
adotá-la, pois mamãe, a líder da família, se achava muito idosa para tal missão,
sendo já bisavó. Eu fui a única a não ser questionada, pois mamãe conhecia de
sobra os graves problemas que eu estava enfrentando naquele momento.
Mas algo me empurrou para o centro da sala e falei:
- Mãe, eu fico com esta criança. Ele veio para mim e só agora entendo a
mensagem do meu sonho.
Todos concordaram. No dia seguinte liguei para o Schultze,
informando que ele seria pai novamente - depois de velho. Ele ficou
tão surpreso, que não quis concordar com a adoção, mas convenci-o facilmente.
Com a ajuda de Marta Leitão de Araújo, competente Assistente Social, cuidei dos
papéis que me dariam o direito de trazer a criança para o Rio. Com dez dias de
nascida, Rosemary Schultze (conforme o documento do juizado de menores)
embarcava num avião da VASP rumo ao Rio de Janeiro, que seria oficialmente
sua cidade natal. Foi logo registrada como nossa filha legítima, nascida em
Copacabana... Rosa e José foram os padrinhos do batismo católico, ainda em
Fortaleza. Rosemary ganhou tantos presentes que ao chegar em casa notei que o
enxoval estava completo. Faltavam, apenas um berço, uma cômoda e uma
banheira. O Schultze se ofereceu para comprá-los, no mesmo dia do
registro civil, e assim assumimos ambos o papel de pais e nos sentíamos
tão felizes como se realmente eu tivesse dado à luz aquela criança.
Confesso que houve um momento em que eu quase
desisti da adoção. Em Mateus 18:5 Jesus fala: “E quem receber uma criança como esta em Meu
nome, a Mim me recebe”. Obedeci, mesmo não sendo ainda convertida ao
evangelho de Cristo.
Rose nos trouxe felicidade (e continua trazendo), porque esta não depende de valores materiais, mas
sempre de valores morais e espirituais. Por isso mesmo existem tantos ricos
infelizes e tantos pobres felicíssimos, neste mundo de Deus!
Mary Schultze, 2000 - atualizado em
2012