A continuação deste relato nos mostra uma das facetas mais obscuras e egoístas do coração humano:
Como é possível alguém ficar "extremamente desgostoso" e "irado" pelo fato de Deus não ter destruído uma cidade inteira?!
Como pode alguém que havia sido tão maravilhosamente liberto do ventre do grande peixe (não era uma baleia, diga-se de passagem) e, logo em seguida, sentir tanta sede de sangue?!
Como entender o fato de um profeta de Deus, um enviado do Altíssimo, ser uma pessoa com um coração tão vingativo e cruel?!
Pois é... a história conta que Jonas era assim! Ele não se conformou pelo fato de que Deus ouviu o clamor dos ninivitas, e compadeceu-Se deles, derramando-lhes Sua graça e Sua misericórdia.
Fico imaginando Jonas, vagando pelas ruas da cidade, pregando a destruição iminente, e dizendo em seu coração:
- Vocês vão ver, raça de víboras! O meu Deus não vai ter um pingo de pena de nenhum de vocês! Vocês não perdem por esperar! Continuem em suas orgias!
Porém, como eu já tenho dito aqui várias vezes, Deus age de uma forma muito "ilógica" do ponto de vista humano. Talvez seja exatamente por isso que nós ainda não tenhamos sido consumidos em nossa hipocrisia e falsa religiosidade... Ele "também" tem misericórdia de nós!
Existem muitos "Jonas" por ai
É uma pena que a fé em Deus não nos livre de mantermos em nosso coração sentimentos tão maus e diabólicos quanto a vingança, o ódio e a intriga! Infelizmente, a capa da religiosidade tem cobrido nossa verdadeira face, a qual, em muitos momentos, se revela mais negra e vil do que a dos piores "ímpios".
Jonas estava com um coração tão cheio de raiva e preconceito contra o povo de Nínive, que não pode aceitar o fato de que eles, vis e devassos como eram, também estavam na mira da graça de Deus. O profeta, apesar de pregar sobre um Deus que é misericordioso e bondoso, não cria nisso. Jonas representa perfeitamente aqueles de nós que só conseguem ver o lado de "justiça" de Deus, mas nunca conseguem enxergar a Sua face de "misericórdia", "graça" e "amor" reveladas constantemente nas Escrituras.
Conheço "crentes" (inclusive Adventistas) que olham para os outros "de cima para baixo", ou seja, com aquele ar de "sou melhor que você". Tais pessoas não conseguem entender como Deus pode amar uma prostitura, um drogado, um adúltero, um presidiário, um político corrupto que faz turismo com o dinheiro público (rsrs)... da mesma maneira que ama aqueles que professam crer em Seu nome.
A diabólica doutrina do inferno tem contribuído com esta maneira deturpada de alguns verem a graça de Deus pelos pecadores. Algumas pessoas gostam de pensar que aqueles que não aceitarem a doutrina de sua denominação, arderão no fogo eterno, em caldeirões de água fervente, com diabinhos espetando seus corpos e dando fezes para comerem e urina para saciarem a sede... Era assim que o quadro era pintado na Idade Média, e tem encontrado reflexo ainda hoje.
A experiência de Jonas deve nos mostrar que não podemos JAMAIS exultar pela perdição eterna de uma alma sequer. Ele concluiu sua pregação e foi para um lugar bem alto, para assistir "de camarote" o desespero e a agonia do ninivitas. Imagino que ele deve ter olhado fixamente para o Céu, à espera do fogo e do enxofre que aniquilariam seus inimigos.
Mas no coração do Senhor haviam outros planos, pois os ninivitas também mudaram sua maneira de proceder.... arrependeram-se e suplicaram a misericórdia.
Nós somos facilmente apegados à letra da lei. Se o Manual diz que é para disciplinar, então que assim seja! Se diz que é para banir da comunhão os insubordinados, então que se faça dessa maneira!
Se Deus tinha dito que destruiria Nínive, então por que voltar atrás? Onde ficaria a "honra", o "bom nome" do profeta?! Como ficaria "a imagem" da sua religião, da sua igreja?!
Ora... vê como o coração humano é mal e pecaminoso? Queremos misericórdia, graça e perdão para nós, mas não agimos assim quando se trata daqueles que nos ofendem, magoam e traem. Para eles, a letra da lei! A "tábua de condenação"!
Já imaginou a surpresa de alguns "conterrâneos" de Jonas quando encontrarem os ninivitas no Reino de Deus (Lucas 11:32)?!
Já imaginou a surpresa de alguns "crentes" de hoje quando encontrarem seu vizinho ateu participando da Ceia do Cordeiro?!
Já imaginou como vai ser um "choque" para alguns legalistas e fariseus modernos quando se depararem com aquele "irmãozinho" que era indisciplinado, negligente, e que não seguia as mesmas "regras morais" que aqueles determinavam?!
Se tem uma coisa que eu aprendi da história de Jonas é a seguinte:
Não devemos julgar as pessoas e, muito menos, condená-las à perdição, pois o Senhor ama a todos e sempre atenderá o pedido sincero de socorro vindo dos lábios (ou da mente) de um de Seus filhos queridos... mesmo que este "filho" esteja todo enlameado pela sujeira deste mundo.
"...mas onde abundou o pecado, superabundou a graça, a fim de que, como o pecado reinou pela morte, assim também reinasse a graça pela justiça para a vida eterna, mediante Jesus Cristo, nosso Senhor" (Rom. 5:20-21).
Amém!